Conto de Natal - Eça de Queirós
“Nos tempos em que Cristo andava por esse mundo, vivia em Jerusalém uma triste viúva, a mais desgraçada das mulheres de Israel”! Seu único filho, todo aleijado, jazia sobre uma cama apodrecida, atrofiando-se e gemendo.
Sobre mãe e filho, como uma noite de pesadelos, caiu a mais profunda miséria. Até azeite faltava, para acender a lâmpada de barro, jogada a um canto.
Um dia, um mendigo entrou no casebre, repartiu o pão que trazia com os dois e, enquanto coçava as feridas da perna, contou que havia aparecido um Rabi, na Galiléia, um homem que amava as criancinhas e que prometia aos pobres um reino luminoso, maior do que a côrte de Salomão!
Com os olhos famintos, a mãe quis saber onde encontrar aquele Rabi e o mendigo suspirou: “Quantos o desejavam e quantos perderam a esperança de encontrá-lo! Obed, tão rico e Sétimus, tão soberano, mandaram caravanas atrás do Rabi, com generosas promessas de recompensa... E as caravanas voltaram, sem ter descoberto em que mata, em que cidade, em que toca ou palácio se escondia JESUS”.
A tarde caia. O mendigo apanhou o seu bordão, desceu, pelo duro trilho, entre a urze e a rocha. A mãe voltou a seu canto, mais vergada, maia abandonada...E então, o filhinho, num murmúrio mais débil que o roçar de uma asa, pediu à mãe que lhe trouxesse esse RABI, que amava as criancinhas, ainda as mais pobres e sarava todos os males, ainda os mais antigos.
A mãe apertou a cabeça, esguedelhada:
-”Oh”! Filho. E como queres que te deixe sozinho e me meta nos caminhos, a procura do RABI DA GALILÉIA?
Coed é rico e tem servos e, em vão, buscaram por Jesus, por areias e colinas... Sétimus é forte, tem soldados e, em vão correram por Jesus, por todos os caminhos!
Como queres que te deixe?
Jesus anda por muito longe e a nossa dor mora aqui, conosco, dentro dessas paredes e, dentro delas, nos prende! E, mesmo que encontrasse, como convenceria eu o Rabi a vir até aqui, para sarar um entrevado tão pobre, sobre uma cama tão em pedaços?”“
A criança, com duas lágrimas nos olhos, murmurou:
-“Oh! Mãe! Jesus ama todos os pequeninos... E eu, ainda tão pequeno e com um mal tão grande e que tanto queria sarar...”.
E a mãe replicou, entre os soluços:
“Oh! Meu filho! Como te posso deixar sozinho? Longas as estradas da Galiléia e curta a piedade dos homens! Até os cães me ladrariam, ao passar... Talvez Jesus morresse... Ninguém o achou! Talvez o céu o tenha levado, da mesma forma que o trouxe...”.
Erguendo, suas mãozinhas que tremiam, o menino suplicou:
“Oh! Mãe eu queria ver Jesus!”
E logo, abrindo devagar a porta e sorrindo, Jesus disse à criancinha:
-“Aqui estou”.