sexta-feira, 19 de novembro de 2010

Anne Rice


Entrevista Com O Vampiro

"... Como já disse, havia muitas coisas das quais Lestat devia ter me avisado. Poderia ter transformado aquela experiência em algo enrriquecedor, sob vários aspectos. Mas não o fez.
-O que poderia ter feito? - Perguntou o rapaz (o entrevistador). - A que se refere?
- O ato de matar não é um ato comum - Disse o vampiro. - A gente não se satisfaz simplesmente com o sangue do outro.
Sacudiu a cabeça.
- Certamente, trata-se do fato de experimentar uma outra vida, às vezes, de experimentar a perda desta vida através do sangue, lentamente. É a contínua repetição das sensações que tive ao perder minha própria vida, ao sugar o sangue do pulso de Lestat e ao ouvir seu coração rufando junto ao meu.
É a contínua celebração desta experiência pois para os vampiros, esta é a suprema experiência.
Falava com extrema seriedade, como se discutisse com alguém que defendesse outro ponto de vista.
- Acho que Lestat jamais chegou a captar isso. talvez não o conseguisse, não sei. Deixe-me dizer que percebia algumas coisas, mas muito poucas, acredito, dentre as que se pode conhecer. De qualquer modo, não se preocupou em me fazer recordar meus sentimentos no momento em que me agarrei a seu pulso para não deixá-lo partir; nem em escolher um lugar onde pudesse viver a experiência de meu primeiro assassinato com alguma calma e dignidade. Precipitou-se para a luta como se precisássemos fugir o mais rapidamente possível de algo que nos perseguisse. Uma vez tendo pego o escravo, imobilizou-o, agarrando-o pelo pescoço.
-Faça-o - disse. - Agora já não pode mais voltar atrás.
-Cheio de repulsa e enfraquecido pela frustração, obedeci. Ajoelhei-me junto ao homem agachado, que ainda lutava e, colocando ambas as mãos em seus ombros, me aproximei de seu pescoço. Meus dentes mal haviam começado a se transformar, e tive de rasgar sua pele, em lugar de perfurá-la. Mas, uma vez feito a ferida, o sangue jorrou. E quando isto aconteceu, me vi abraçado a ele, bebendo... enquanto todo o resto se desvanecia.
- Lestat, o pântano e os ruídos do acampamento distante nada significavam. Lestat poderia ser mais um inseto, zunindo, piscando e depois se diluindo em sua insignificância. O ato de sugar me hipnotizava; a força do homem cedia sob a tentação de minhas mãos; e então surgiu, novamente, o som do tambor, que era o rufar de seu coração - só que, desta vez, perfeitamente ritmado com as batidas do meu, os dois ressoando em cada fibra de meu ser, até que o rufar começou a ficar cada vez mais lento, até não ser mais do que um ronco suave, que ameaçava continuar eternamente..."