Tese e Antítese
I
Já não sei o que vale a nova idéia,
Quando a vejo nas ruas desgrenhada,
Torva no aspecto, à luz da barricada,
Como bacante após lúbrica ceia!
Sanguinolento o olhar se lhe incendeia…
Aspira fumo e fogo embriagada…
A deusa de alma vasta e sossegada
Ei-la presa das fúrias de Medéia!
Um século irritado e truculento
Chama à epilepsia pensamento,
Verbo ao estampido de pelouro e obus…
Mas a idéia é num mundo inalterável,
Num cristalino céu, que vive estável…
Tu, pensamento, não és fogo, és luz!
II
Num céu intemerato e cristalino
Pode habitar talvez um Deus distante,
Vendo passar em sonho cambiante
O Ser, como espetáculo divino:
Mas o homem, na terra onde o destino
O lançou, vive e agita-se incessante…
Enche o ar da terra o seu pulmão possante…
Cá da terra blasfema ou ergue um hino…
A idéia encarna em peitos que palpitam:
O seu pulsar são chamas que crepitam,
Paixões ardentes como vivos sóis!
Combatei pois na terra árida e bruta,
Té que a revolva o remoinhar da luta,
Té que a fecunde o sangue dos heróis!